top of page

O Círculo

Início: Bem-vindo
Início: Blog2

António Variações e a muito humana condição de Estar além.

  • Foto do escritor: Francisco Pinto
    Francisco Pinto
  • 7 de abr. de 2021
  • 2 min de leitura

António Variações não será certamente um nome estranho quer para os apreciadores de música popular portuguesa, quer para os mais atentos e assíduos leitores d’O Círculo. O emblemático cantor-poeta, que nas suas contradições personificou muito do que era o sentimento coletivo da época, trouxe para o cenário da música portuguesa uma enorme variedade de novos estilos, mas sobretudo uma literariedade na qual eram evidentes as influências pessoanas.


Estou além, sem dúvida um dos temas mais celebrados de António Variações, constitui também prova do seu talento poético pela forma como retrata, à luz das mais distintas imagens, o estado de eterna e insatisfeita procura que caracteriza a condição humana. Estou além fala-nos de um sujeito ansioso e em fuga de uma solidão fatalmente por si perpetuada pela permanente recusa de quem lhe oferece a mão em prol do desejo por aquele que ainda não viu e tão pouco conheceu. Trata-se de uma inquietação quase patológica que se manifesta, à medida que a música progride, na infindável procura pelo lugar onde pertence, transformando o sujeito num barco sem destino último, eternamente iludido pela ideia de que o próximo será o lugar onde encontrará a realização definitiva e plena. É ao som de harmonias alegres e algo modernas que António Variações canta um dos derradeiros paradoxos da existência humana: o da eterna insatisfação, o de querer sempre mais e diferente e com isso permanecer fatal e eternamente à procura do que se parece revelar sempre efémero e insuficiente.


O riff de guitarra elétrica que introduz o verso, o baixo, os experimentais sintetizadores e os belíssimos solos de saxofone são os elementos sonoros responsáveis pela criação de toda uma atmosfera de pop-rock consideravelmente alegre que me parece produzir uma boa combinação com a temática da permanente insatisfação, como se essa inevitavelmente eterna procura pelo “mundo” e “lugar” devesse ser abraçada com um positivismo absurdista em vez de com medo e ansiedade.

Trata-se, portanto, de um tema com corpo de rock e alma de poema que, sendo bastante popular, parece-me representativo daquilo que Variações melhor conseguia fazer: ao som de uma miscelânea de sons e estilos inovadores para a época, explorar conceitos interessantes e extremamente poéticos a partir de uma métrica fortemente musical (quem não conhece os versos “Estou bem onde eu não estou/Porque eu só quero ir/Onde eu não vou”?). Nesta medida, é difícil olhar com atenção para a sua obra sem reparar nas contradições muito pessoanas: se por um lado se verifica em temas como Quero é viver a euforia do amor à vida, em Estou além torna-se mais visível a inquietude da “sensação que estou a perder”.


Tendo saído em 1982 como o primeiro single original de António Variações, Estou além foi o início de uma obra que, embora curta, muito influenciou a música popular portuguesa dos anos seguintes pela sua originalidade tanto a nível musical como lírico, tendo sido capaz de deixar uma marca na cultura pop dos nossos tempos que se torna cada vez mais evidente à medida que mais homenagens vão surgindo tanto no domínio da música como do cinema. Posto isto, é sem dúvida um tema a revisitar com ouvido atento.


Francisco Pinto, estudante de Economia na Nova SBE





Comments


Entra em contacto

Somos O Círculo, seja O Círculo também.
Envia-nos aquilo que queres partilhar com o mundo!

967434145

Obrigado pelo envio!

Início: Entre em contato

©2019 por O Círculo. Pela Arte, Política, Cultura e Fé.

bottom of page