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Caminho, confusão e silêncio em A Invenção do Dia Claro, dos Capitão Fausto

  • Foto do escritor: Francisco Pinto
    Francisco Pinto
  • 17 de fev. de 2021
  • 3 min de leitura



Foi num estado quase embrionário que os jovens Capitão Fausto se assumiram como uma banda de alguma versatilidade no que toca ao género musical, característica que se tem vindo a tornar cada vez mais evidente à medida que vamos sendo premiados com novos álbuns da banda de Alvalade. Se em Gazela fomos introduzidos a um rock jovem e enérgico, ao qual Pesar o Sol veio acrescentar uma profunda marca indie, os dois últimos álbuns vieram trazer toda uma nova variedade de sonoridades que tornou o enquadramento da banda no espectro musical consideravelmente mais complexo.


Em A Invenção do Dia Claro, de 2019, para além de uma referência à obra de Almada Negreiros, está muito presente uma dicotomia entre a utilização de ritmos e melodias mais simples e pop e a recuperação do protagonismo de instrumentos "clássicos" com melodias mais exigentes e complexas do ponto de vista técnico, mas indubitavelmente dotadas de uma beleza e harmonia que muito acrescentam à originalidade do mais recente álbum da banda portuguesa.


Após um Capitão Fausto têm os dias contados que versa, entre outras coisas, sobre a transição entre a adolescência e a idade adulta, a banda regressou com mais maturidade, num álbum que, embora nem sempre, se revelou bastante mais melancólico e introspetivo, sobretudo na análise de variáveis como o tempo. O álbum começa bastante bem, com Certeza, marcada por uma transição de um soft-rock de suave guitarra e piano, presente ao longo de todo o verso, para um final extremamente intenso e rico em acordes fortes de guitarra, sintetizadores, piano e um belíssimo solo de clarinete, numa autêntica miscelânea de sons introduzida pelo importante verso "Eu escolho encher os dias com ruído e confusão”, que de alguma forma surge como apresentação da temática que vai sendo trabalhada ao longo do álbum.


Numa análise mais geral, até nas músicas mais alegres e populares há espaço para a comunhão entre melodias comuns ou populares e sons menos convencionais e mais clássicos, o que se verifica na presença do trompete na radiofónica Boa memória, nos preciosos pedaços sonoros de violino, violoncelo e piano em Lentamente e até nos trombones e tuba da animada Faço as vontades. Por outro lado, em músicas mais melancólicas, o piano é claramente protagonista, estando ao serviço de um sujeito que se redescobre na relação com os outros, num estado de calma e lucidez particularmente notório em Amor, a Nossa Vida e Final, em que um bonito e suave solo de guitarra permite transparecer a soturnidade de quem repensa o passado a fim de compreender o presente e a forma como o tempo nos vai moldando a nós e aos outros.


No que toca à sua estrutura, A Invenção Do Dia Claro retrata um processo de amadurecimento do sujeito que consiste em revisitar a própria identidade naquilo que é a sua natureza humana, em particular naqueles que são os seus defeitos, que bem conhece. No entanto, sendo verdade que ao longo do álbum o conflito com esses mesmos vícios é uma constante, a postura do sujeito perante o mesmo parece tornar-se mais adulta. De facto, se no início do álbum, o sujeito começa por preferir "encher os dias de ruído e confusão", enquanto escape e fuga ao conflito interior que o atormenta, no Final, este termina quase em silêncio, com tempo e espaço para repensar o passado e reinventar o presente e o futuro.


As opções instrumentais, de notável riqueza, fazem transparecer este contínuo crescimento psicológico, através de uma obra que tem sucesso a conciliar o simples e o complexo. Trata-se, portanto, de mais um bom álbum que muito vem acrescentar à identidade musical dos Capitão Fausto, justificando a crescente afirmação do jovem grupo enquanto protagonista no cenário atual da música portuguesa.


Francisco Pinto, estudante de Economia na Nova SBE

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