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Férias

  • Foto do escritor: Francisco Lopes Matias
    Francisco Lopes Matias
  • 16 de ago. de 2020
  • 4 min de leitura

“Estou saindo de férias, volto assim que me encontrar”. Há poucos dias, li esta simples (embora nada fácil) frase da cronista e escritora brasileira Martha Medeiros, enquanto se conjugavam, nos meus ouvidos, o relaxante bater das ondas na areia da praia e as exclamações entusiasmadas das crianças a jogar cartas.


Estamos em Agosto, por excelência o mês em que, ano após ano, o quotidiano de todos nós é subitamente interrompido durante dias ou semanas, pondo, provisoriamente, fim à azáfama das cidades, dos carros e dos rígidos horários e substituindo-os por uma vivência calma de dias de praia ou manhãs de campo, normalmente em família ou com os amigos de quem mais gostamos.


A propósito deste período, o poeta Ruy Belo escreveu que “somos crianças feitas para grandes férias” e a verdade é que não há ninguém que não espere ansiosamente o início da pausa académica ou profissional e que não sinta alguma desilusão pelo fim da mesma. Ouso mesmo afirmar, na sequência do verso do escritor ribatejano, que o momento alto do nosso ano são mesmo as férias.


Desde mergulhos nas águas quentes do Algarve ao mar gelado e combativo da Costa Oeste, passando por almoços e jantares na praia com amigos ou por churrascos animados em família, por caminhadas e caçadas em quintas ou mesmo por viagens e passeios culturais, as férias são o momento do ano em que substituímos as obrigações que somos chamados a cumprir no dia-a-dia por um período divertido e descontraído, em que o tempo é muito e a liberdade para escolher o que fazer com ele é ainda maior.


Mas não devemos correr o risco de pensar as férias (e consequentemente vivê-las) como uma realidade alternativa ou uma outra vida, em que nada mais interessa e em que os problemas da vida corrente são ignorados ou “deixados para depois”. Temos de viver as férias como um momento de reflexão acerca da vida, como um período em que ganhamos uma nova força e um novo ânimo para enfrentar os desafios do quotidiano, nem sempre fáceis e muitas vezes exigentes.


Não devemos também levar as férias de uma forma ociosa e inactiva. Não podemos simplesmente passar pelas férias, temos de viver as férias. Este deve ser um período calmo, mas nunca passivo. É necessário viver a tranquilidade e liberdade destes dias com tanta intensidade e compromisso como vivemos o dia-a-dia do trabalho e do stress. Não devemos simplesmente demitirmo-nos de uma atitude activa durante estas semanas, pois isto faria das férias um desperdício de tempo e não um período excepcional e incomparável do ano.


Por isso, as férias são uma excelente altura para conversar mais e aprofundar relações – de amizade ou familiares –, para ler um livro que cultive o espírito ou mesmo para nos iniciarmos numa actividade que treine o corpo, mas também para aproveitar a vivência rural de modo a respirar ar puro; a ida às aldeias familiares para voltar às raízes e, por fim, o mar (mais ou menos frio e calmo) para nos refrescarmos, de forma a que possamos viver bem estes prazeres aparentemente indiferentes, mas profundamente construtivos e saudáveis. Para além disso, este ano, para os amantes de futebol (nos quais eu me incluo), até temos uma série de jogos desta inédita Champions League ao nosso dispor, o que nos permite ver e usufruir, com tempo, do melhor que existe no “desporto rei”.


Por último, permita-me o leitor que regresse à citação com a qual comecei o texto: “Estou saindo de férias, volto assim que me encontrar”. De facto, não há melhor altura do que as férias para nos encontrarmos connosco mesmos, com os nossos desejos mais profundos e com os medos, fracassos, sucessos e sentimentos que marcaram o nosso ano e a nossa “normalidade” quotidiana. É tempo de olhar para trás, para a frente e para dentro.


Em primeiro lugar, devemos, com um olhar atento e retrospectivo, rever o ano que passou e olhar para o que fizemos bem e para o que fizemos mal, para o que podíamos ter feito e não fizemos, para o que mudámos e para o que aprendemos. Podemos aproveitar este tempo para reconhecer que neste último ano as experiências e as pessoas com que lidámos nos fizeram crescer e moldaram, de alguma forma, a nossa personalidade. Por outro lado, também temos de olhar para a frente e para o que será o próximo ano. O que mudar em relação ao ano que passou, como abordar o que pode daí advir, que pessoa queremos ser nos próximos meses. Por último (mas talvez o mais importante), estes dias de férias são tempo de olhar para dentro, para nós mesmos e para o que dentro de nós não passa. Mais do que olhar, ver o que somos, de que forma vemos o mundo e o que queremos atingir na vida, o que nos faz felizes (independentemente do ano em que nos encontramos), o que fica do ano que passou, o que somos sempre, a que é que nos agarramos e em que é que baseamos a nossa identidade.


Estas perguntas todas precisam de respostas e, para sermos felizes e amarmos a vida e o mundo, é preciso também conhecermo-nos e ao nosso próprio ser. Só assim poderemos estar em paz com o que nos rodeia. E há melhor altura para esta reconciliação do que as férias?

Assim, as tão desejadas viagens exteriores protagonizadas nas férias devem sempre ser complementadas com um caminho interior de auto-conhecimento que nos faça, no regresso às obrigações da vida corrente, olhar o mundo de uma forma mais global e comprometida, rejuvenescida por um período de descanso que, ao invés de estagnação, significa uma contemplação profunda da natureza, do outro e do eu.


Para terminar, não nos podemos esquecer de que, como tantos cartazes pelo País enfatizam, “o vírus não foi de férias”. Por isso, toda a diversão e descanso próprios deste período são bem-vindos, mas nunca esquecendo a cautela e o cuidado com uma doença que já ceifou a vida a milhares de pessoas. Está nas nossas mãos conciliar férias e saúde. E somos capazes de fazê-lo como ninguém.


Boas férias a todos!



O autor não escreve em conformidade com as regras do novo Acordo Ortográfico.

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